The Town of Light é um daqueles jogos que vive escondido nas lojas digitais do PlaySation, Xbox, Steam e que vez ou outra entra em promoção. A pouca exposição para o grande público aliado a elementos que podem fazer menos atrativo talvez afaste aqueles que gostem de uma estória profunda e com várias camadas interpretativas.

Em alguns canais o jogo é classificado como terror, mas verdade seja dita é errado rotular apenas por esse gênero, consegue na verdade apresentar um drama psicológico. Aqui não tem espaço para monstros, fantasmas, psicopatas, nada dessas coisas. Toda construção é baseada nas memórias da protagonista Renée ao retornar as ruínas da instituição psiquiátrica onde foi internada aos 16 anos. Progredindo na campanha flashbacks desse período são revelados.

Um dos trunfos está em sua jogabilidade simples. O comando é resumido numa lanterna para guiar em locais mais escuros e num botão específico para pegar objetos, abrir portas, ativar certos mecanismos. Essa simplicidade aparenta ser proposital, aqui o mais importante é sentir o peso da estória que por si só deixa qualquer um estarrecido. Esse é o grande diferencial tendo em vista a inspiração em relatos reais.



O alicerce central está na vulnerabilidade. O jogo lampeja alguns dos procedimentos comuns em manicômios nas primeiras décadas do século XX, aqui apresentado na Itália, entretanto, tais métodos mais ligados a tortura do que procurar qualquer tipo de bem-estar ou recuperação circularam por todo o mundo. Fora isso monstra também que pacientes poderiam estar à mercê daqueles que deveriam auxiliar o tratamento a exemplo da violência sexual e da impotência em ir contra.

Renée passa ser o resultado dos maus-tratos, dos abusos, do ambiente hostil. A narração é confusa e pouco confiável uma vez não sabe distinguir o passado do presente, sua psiquê está quebrada e os problemas que a levaram ser internada terminaram agravados. Um lugar sem comunicação, notícias, conforto e sob grande pressão psicológica onde os médicos encobriam parte de suas ações por não enxergarem aquelas pessoas como serem humanos e sim ferramentas para experimentos. A busca por esclarecimentos revela mais desordem juntamente com a progressão, quanto mais se conhece da estória mais é compreendido sobre embaralhamento dos fatos.

Para melhor entendimento é incentivado buscar as páginas do diário da protagonista espalhadas pelas ruínas do prédio, com ele é possível preencher algumas lacunas na narrativa. Encontrar todas as folhas (8 no total) desbloqueia uma conquista que não é difícil de conseguir. Esse talvez possa ser um dos pecados, não existe desafios em resolver os poucos puzzles, tudo é muito exposto e feito para serem localizados de forma rápida.

A jogabilidade presente e ênfase na narrativa faz mais próximo de um filme interativo. Seu tempo, caso não aja pela procura pelas conquistas, dura por volta de 1h30 a 2h. Tirando os poucos colecionáveis não existe estímulos para explorar as dependências da instituição e seus vários anexos. Agora algo que agrada são as diferentes possibilidades de avanço já quem em determinados capítulos é dado a chance de escolher respostas que mudam certas passagens. Isso faz que após concluir a campanha o jogador possa ter interesse de jogar novamente para conhecer esses outros caminhos. 



Por ser de um estúdio pequeno, LKA.it, apresenta limitações no quesito gráfico onde mistura artes em 2D com uma ambientação em 3D no motor gráfico Unity. Enquanto as ilustrações seguem estilo próximo de um Valiant Hearts, por exemplo, a parte cujo tenta imprimir realismo fica aquém quase como um título de início de geração do PS3 principalmente ao retratar figuras humanas. Outros problemas são os carregamentos que podem demorar e quedras de frame. Contudo, é compreensível pelos recursos e tamanho da equipe, isso não atrapalha de forma contudente além de conseguir reproduzir a ideia proposta para o título de maneira satisfatória.

Os poucos recursos em tela, a ausência da trilha sonora durante boa parte da campanha que dá lugar aos passos e sons ora comuns aos locais abandonados ora cantos de pássaros na natureza são aspectos que enriquecem a composição por lembrar que a personagem está ali sozinha apenas acompanhada pelos pensamentos próprios. Sem dúvida um jogo com muito a dizer através do vazio e solidão.

É louvável que The Town of Light ganhou versões para diferentes plataformas, a última delas em 2020 no Nintendo Switch, com uma proposta intimista e que aborda temas não tão explorados nesse tipo de mídia todo tipo de reconhecimento é bem-vindo por trazer uma reflexão madura. O mal não precisa ser personificado pelo sobrenatural, criaturas monstruosas ou algum tipo de lunático com superpoderes, mas pode estar em situações corriqueiras, a natureza humana é capaz de atrocidades inimagináveis.